domingo, 26 de agosto de 2012

Ey... Du...

Suedeutsche Zeitung, 25/26.08.2012

Da série: há limites (jurídicos) para a arte e o humor?!

Tradução: 
"Em Kassel, uma discutível caricatura de Jesus foi retirada depois de protestos da Igreja. O poster, que servia como propaganda para uma exposição, foi retirado da parede externa a pedido do artista, Mario Lars, explicou o diretor do museu "Caricatura - galeria para arte cômica". No desenho, que agora pode ser visto apenas no interior do prédio, uma voz vinda do céu diz ao Jesus crucificado: - Oi... Tu aí... Eu fodi a tua mãe."
A questão é: pode isso, Arnaldo?!

sábado, 25 de agosto de 2012

This isn't a car...


... nor is it a conservative movie. 

Publiquei isso na discussão iniciada por um amigo no Facebook, mas repito aqui só por não ter nada melhor pra escrever. Fiz algumas modificações, mas nada que mude o espírito ou os argumentos que empreguei por lá. Enfim, cheguei bem atrasado ao debate sobre o conservadorismo ou reacionarismo do Batman – O Cavaleiro das Trevas Ressurge, já que só ontem consegui assistir ao filme. O bom é que esse comentário se perde na miríade de comentários do Facebook (bem como na miríade de baboseiras que se escreve em blogs absurdos e irrelevantes como este!).
Com todas as venias e devidas venias e concessas venias, acho que essa leitura de que o filme nada mais é do que um libelo contra os movimentos occupies ao redor do mundo, ou contra a "revolução comunista", é simplista demais, para não dizer simplória e simplificante demais.

(Aviso: há spoilers)

O Nolan, me parece, quis fazer uma versão cinematográfica do A Tale of TwoCities  do Dickens. Isso fica absolutamente claro quando o comissário Gordon lê um parágrafo sensacional do livro no meio do filme. E acho – sinceramente - que o diretor atingiu o seu objetivo. Sem entrar em discussões sobre o livro em si, ou quanta similaridade há entre o filme e o livro, vemos que não há, por motivos óbvios, tanto drama nos tribunais revolucionários (apesar de que condenar alguém a morte com a pena de exílio é simbolicamente excelente), e com personagens mais redondinhos e nem tão unidirecionais como no romance. Enfim, Nolan pegou um ótimo romance, colocou máscaras nos protagonistas, uma bomba atômica, uns carros voadores e filmou um dos livros mais importantes da literatura ocidental. 
O Batman está mais lúgubre do que nunca. Chega, em certos momentos, a ser o anti-herói. Bane, bom, ele nem consegue ser o anti-herói. Ele é o anti-anti-herói. É um idiota manipulado. Um coitado que não sabe nem o porquê de estar fazendo tudo aquilo. A vingança que ele busca nem dele é. Consegue imaginar a ridicularia que é começar uma revolução para atingir os objetivos de uma terceira pessoa? Doar a própria vida para realizar sonho alheio? O quão patético é isso? Bane, aliás, não é digno nem de pena, só de compaixão. É um sujeito que vive com dor ou dopado. Se bobear, os dois. E ao dizer "I'm Gotham's reckoning" ele fica invariavelmente com jeitão de profeta de terceira categoria. Uma pergunta aos que acham o filme reacionário: deve-se dar armas aos que foram presos injustamente? Ou deve dar-lhes a liberdade e uma indenização? 
Bane, por sinal, é a própria negação desses movimentos occupies, que supostamente são criticados no filme: ele personifica o dirigente que manda e centraliza, enquanto tais movimentos se querem horizontais e pulverizados. Ele fixa metas e dita os objetivos, enquanto os movimentos são – em tese – multipolarizados... Pode-se fazer o que quiser - como ele diz na cena da prisão - mas desde que isso esteja de acordo com o plano dele (melhor: plano da Miranda/Talia). Tanto é assim que a Cat Woman faz o que ela quer (Do as you please ele diz) e ele tenta matar a coitadinha já que ela não se encaixa no plano...  
Além do mais, quer me parecer, o Nolan, em duas cenas, deixa claríssimo que ele está do outro lado, do lado dos "occupants": quando Bane lê a carta em frente da prisão, dizendo que aqueles homens estão presos em funcao de um "false idol" (o que é uma verdade, aliás, foi criado o Harvey Dent-Day!!) e, depois, na cena com o ônibus cheio de crianças querendo atravessar, toma o lado dos que lutam contra a opressão policial. Não é possível, tendo sentimentos, ficar ao lado daqueles que querem "cumprir as ordens" não deixando crianças pré-escolares passarem. Aqui, e o Nolan deixa isso claríssimo, o sistema está mal sintonizado e isso acarretará uma injustiça extrema.   
O filme pode ser considerado conservador? Até pode ser, mas ele não é tão simples e infantil que permita uma leitura final e acabada. Há nuances enormes que possibilitam aberturas interpretativas.

Mas, talvez, estejamos apenas lendo demais num simples pedaço de entretenimento. Aliás, duas horas e meia do entretenimento da mais alta qualidade. 


terça-feira, 21 de agosto de 2012

Uma pequena...

... e atrasada homenagem ao Dia dos Pais.


E quem não sonha um dia em dançar assim?

Trilha sonora aqui.

terça-feira, 7 de agosto de 2012

I. Seven. Nine. Pay. No. No. No.



Imagine a cena: um caixa de supermercado, no final do expediente, pede a carteira de identidade de uma menina chinesa que parecia ter menos de 16 anos (a idade mínima para comprar cerveja). A chinesa não entende e começa a falar uma estranha língua, onde se consegue entender, entre sons esquisitos, algumas palavras em inglês. Rapidamente se nota que ela tenta falar inglês e não consegue. A caixa, constrangida, fala apenas alemão. Ambas olham para o sujeito que está esperando (um doce para quem acertar quem era) e pedem, imploram ajuda com o olhar.
Eu, solícito, retiro meus fones de ouvido - que me separam de qualquer possibilidade de convivência -, e pergunto (em inglês) à chinesa se ela tem um documento de identidade. Ela me olha, processa aquelas palavras, sorri e balança a cabeça afirmativamente. Eu digo, então, à senhora do caixa que ela, sim, tem um documento de identidade. Ambos esperamos. A chinesa também espera. Passados alguns segundos constrangedores, torno a perguntar. A chinesa concorda mais uma vez. A caixa, impaciente, começa a chamar o gerente pelo alto-falante. 
Tenho uma ideia genial: retiro o meu passaporte da mochila e mostro pra ela. Uma lâmpada metafórica acende-se sobre a cabeça da chinesa e ela retira o seu passaporte da mochila e me mostra. Confiro algumas datas e vejo que consta: 30-01-1987. Mostro o meu passaporte à caixa, como que ensinando à chinesa o que ela deveria ter feito desde sempre. Ela, bastante desconfiada, faz o mesmo. A caixa me olha, balança a cabeça, me pergunta quantos anos ela tem e se eu achava que o passaporte era falsificado. Nisso chega o gerente e escuta apenas as palavras mágicas: passaporte falsificado. Ele começa a vociferar contra a chinesa, dizendo que ia chamar a polícia federal, que ela não poderia fazer isso apenas para comprar cerveja. A chinesa deu de ombros. Como ela não entendia nada do que estava sendo falado, aquele senhor poderia estar gritando comigo. Ou com a caixa. Ou mesmo com ela, mas isso não importava. 
Explicada a situação ao gerente, a chinesa entrega uma nota de 20 euros, recebe (e confere!) o seu troco e vai-se embora. Até aqui já seria uma história engraçada de contar aos amigos durante aqueles almoços monótonos e sem assunto. Mas a vida é uma caixinha de surpresas, para citar um famoso sketch humorístico. Enquanto eu me preparava para digitar a senha do meu cartão, para pagar pelas minhas comprar (salada, peito de frango e 7 caixinhas de morangos congelados, para os curiosos) a chinesinha de 25 anos, com cara de pré-adolescente volta, se mete na minha frente e começa a gritar as palavras (sons?) que dão título ao post:
- I – Seven - Nine – Pay – No, No, No. 
- I – Seven - Nine – Pay – No, No, No. 
- I – Seven - Nine – Pay – No, No, No. 

A caixa me olha. Eu olho pra caixa. Ambos olhamos pra chinesa. Ela está furiosa. Ela segura um quilo de farinha na mão e grita:
- I – Seven - Nine – Pay – No, No, No. 
- I – Seven - Nine – Pay – No, No, No.

Tentando ajudar, olho pra chinesa e pergunto: - What happened?
Ela me olha, como se quisesse me matar com olhos, já achando que eu faço parte do staff do supermercado e grita ainda mais alto:
- I – Seven - Nine – Pay – No, No, No. 

Ela toma mais um fôlego, pensa da Amy Winehouse, e grita de novo:
No, No, No. Seven. Nine. Pay. No, No, No. 

Eu, tentando me desvencilhar daquela confusão, os outros clientes já me olhando, pensando que eu tinha xingado a chinesa, a caixa nos olhando, pensando que estava sendo gravada para a versão alemã da Pegadinha do Mallandro (rá-yeah-yeah) a chinesa gritando: No. No. Seven. Nine. E mostrando aquele saco de farinha.
Percebo que ela não concorda com o que pagou pela farinha. Que há um desencontro entre o preço apontado na prateleira e o preço que ela pagou. Tento acalmar e digo:
- Ok. I understand your predicament. You paid one euro and seventy-nine cents for this flour. How much do you think you should have paid? 

Percebo que a frase está um pouco complexa. Reformulo:
- You seven nine. How much you pay?- pergunto como se fosse o Tarzan recém aprendendo a falar. Ou a Chita. 
Ela me olha e diz: - I pay one four nine. No seven nine. Too much. Too much.

Respiro fundo, olho pra caixa e explico a situação. A caixa me olha, incrédula, e pergunta o que ela deve fazer. Eu olho pra ela e digo: - Chama o gerente.
Rapidamente saio do supermercado, monto na minha bicicleta e venho pra casa. No caminho me sinto culpado por ter abandonado a chinesa no supermercado, reclamando os seus trinta centavos. Só espero que o gerente não chame a polícia.
Chego em casa, sento para escrever este texto com apenas um pensamento na cabeça: eu sou uma pessoa ruim.