terça-feira, 2 de outubro de 2012

Christiania

Esqueça tudo que você escutou até hoje de música dinamarquesa.
Feche os olhos e balance ao som de Lukas Graham, com seu soul-pop-groove direto da vila hippie mais famosa do mundo.
< voz do Faustão> Ô loco, meu! < / voz do Faustão>



sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Favoire

Uma frase que poderia ser usada mais frequentemente. 


Bruno, como se vê, é um gênio incontestável.
 Post em homenagem ao meu querido amigo MAR. 

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Ain't no love...

Para embalar um finalzinho de quarta-feira de outono...

domingo, 26 de agosto de 2012

Ey... Du...

Suedeutsche Zeitung, 25/26.08.2012

Da série: há limites (jurídicos) para a arte e o humor?!

Tradução: 
"Em Kassel, uma discutível caricatura de Jesus foi retirada depois de protestos da Igreja. O poster, que servia como propaganda para uma exposição, foi retirado da parede externa a pedido do artista, Mario Lars, explicou o diretor do museu "Caricatura - galeria para arte cômica". No desenho, que agora pode ser visto apenas no interior do prédio, uma voz vinda do céu diz ao Jesus crucificado: - Oi... Tu aí... Eu fodi a tua mãe."
A questão é: pode isso, Arnaldo?!

sábado, 25 de agosto de 2012

This isn't a car...


... nor is it a conservative movie. 

Publiquei isso na discussão iniciada por um amigo no Facebook, mas repito aqui só por não ter nada melhor pra escrever. Fiz algumas modificações, mas nada que mude o espírito ou os argumentos que empreguei por lá. Enfim, cheguei bem atrasado ao debate sobre o conservadorismo ou reacionarismo do Batman – O Cavaleiro das Trevas Ressurge, já que só ontem consegui assistir ao filme. O bom é que esse comentário se perde na miríade de comentários do Facebook (bem como na miríade de baboseiras que se escreve em blogs absurdos e irrelevantes como este!).
Com todas as venias e devidas venias e concessas venias, acho que essa leitura de que o filme nada mais é do que um libelo contra os movimentos occupies ao redor do mundo, ou contra a "revolução comunista", é simplista demais, para não dizer simplória e simplificante demais.

(Aviso: há spoilers)

O Nolan, me parece, quis fazer uma versão cinematográfica do A Tale of TwoCities  do Dickens. Isso fica absolutamente claro quando o comissário Gordon lê um parágrafo sensacional do livro no meio do filme. E acho – sinceramente - que o diretor atingiu o seu objetivo. Sem entrar em discussões sobre o livro em si, ou quanta similaridade há entre o filme e o livro, vemos que não há, por motivos óbvios, tanto drama nos tribunais revolucionários (apesar de que condenar alguém a morte com a pena de exílio é simbolicamente excelente), e com personagens mais redondinhos e nem tão unidirecionais como no romance. Enfim, Nolan pegou um ótimo romance, colocou máscaras nos protagonistas, uma bomba atômica, uns carros voadores e filmou um dos livros mais importantes da literatura ocidental. 
O Batman está mais lúgubre do que nunca. Chega, em certos momentos, a ser o anti-herói. Bane, bom, ele nem consegue ser o anti-herói. Ele é o anti-anti-herói. É um idiota manipulado. Um coitado que não sabe nem o porquê de estar fazendo tudo aquilo. A vingança que ele busca nem dele é. Consegue imaginar a ridicularia que é começar uma revolução para atingir os objetivos de uma terceira pessoa? Doar a própria vida para realizar sonho alheio? O quão patético é isso? Bane, aliás, não é digno nem de pena, só de compaixão. É um sujeito que vive com dor ou dopado. Se bobear, os dois. E ao dizer "I'm Gotham's reckoning" ele fica invariavelmente com jeitão de profeta de terceira categoria. Uma pergunta aos que acham o filme reacionário: deve-se dar armas aos que foram presos injustamente? Ou deve dar-lhes a liberdade e uma indenização? 
Bane, por sinal, é a própria negação desses movimentos occupies, que supostamente são criticados no filme: ele personifica o dirigente que manda e centraliza, enquanto tais movimentos se querem horizontais e pulverizados. Ele fixa metas e dita os objetivos, enquanto os movimentos são – em tese – multipolarizados... Pode-se fazer o que quiser - como ele diz na cena da prisão - mas desde que isso esteja de acordo com o plano dele (melhor: plano da Miranda/Talia). Tanto é assim que a Cat Woman faz o que ela quer (Do as you please ele diz) e ele tenta matar a coitadinha já que ela não se encaixa no plano...  
Além do mais, quer me parecer, o Nolan, em duas cenas, deixa claríssimo que ele está do outro lado, do lado dos "occupants": quando Bane lê a carta em frente da prisão, dizendo que aqueles homens estão presos em funcao de um "false idol" (o que é uma verdade, aliás, foi criado o Harvey Dent-Day!!) e, depois, na cena com o ônibus cheio de crianças querendo atravessar, toma o lado dos que lutam contra a opressão policial. Não é possível, tendo sentimentos, ficar ao lado daqueles que querem "cumprir as ordens" não deixando crianças pré-escolares passarem. Aqui, e o Nolan deixa isso claríssimo, o sistema está mal sintonizado e isso acarretará uma injustiça extrema.   
O filme pode ser considerado conservador? Até pode ser, mas ele não é tão simples e infantil que permita uma leitura final e acabada. Há nuances enormes que possibilitam aberturas interpretativas.

Mas, talvez, estejamos apenas lendo demais num simples pedaço de entretenimento. Aliás, duas horas e meia do entretenimento da mais alta qualidade. 


terça-feira, 21 de agosto de 2012

Uma pequena...

... e atrasada homenagem ao Dia dos Pais.


E quem não sonha um dia em dançar assim?

Trilha sonora aqui.

terça-feira, 7 de agosto de 2012

I. Seven. Nine. Pay. No. No. No.



Imagine a cena: um caixa de supermercado, no final do expediente, pede a carteira de identidade de uma menina chinesa que parecia ter menos de 16 anos (a idade mínima para comprar cerveja). A chinesa não entende e começa a falar uma estranha língua, onde se consegue entender, entre sons esquisitos, algumas palavras em inglês. Rapidamente se nota que ela tenta falar inglês e não consegue. A caixa, constrangida, fala apenas alemão. Ambas olham para o sujeito que está esperando (um doce para quem acertar quem era) e pedem, imploram ajuda com o olhar.
Eu, solícito, retiro meus fones de ouvido - que me separam de qualquer possibilidade de convivência -, e pergunto (em inglês) à chinesa se ela tem um documento de identidade. Ela me olha, processa aquelas palavras, sorri e balança a cabeça afirmativamente. Eu digo, então, à senhora do caixa que ela, sim, tem um documento de identidade. Ambos esperamos. A chinesa também espera. Passados alguns segundos constrangedores, torno a perguntar. A chinesa concorda mais uma vez. A caixa, impaciente, começa a chamar o gerente pelo alto-falante. 
Tenho uma ideia genial: retiro o meu passaporte da mochila e mostro pra ela. Uma lâmpada metafórica acende-se sobre a cabeça da chinesa e ela retira o seu passaporte da mochila e me mostra. Confiro algumas datas e vejo que consta: 30-01-1987. Mostro o meu passaporte à caixa, como que ensinando à chinesa o que ela deveria ter feito desde sempre. Ela, bastante desconfiada, faz o mesmo. A caixa me olha, balança a cabeça, me pergunta quantos anos ela tem e se eu achava que o passaporte era falsificado. Nisso chega o gerente e escuta apenas as palavras mágicas: passaporte falsificado. Ele começa a vociferar contra a chinesa, dizendo que ia chamar a polícia federal, que ela não poderia fazer isso apenas para comprar cerveja. A chinesa deu de ombros. Como ela não entendia nada do que estava sendo falado, aquele senhor poderia estar gritando comigo. Ou com a caixa. Ou mesmo com ela, mas isso não importava. 
Explicada a situação ao gerente, a chinesa entrega uma nota de 20 euros, recebe (e confere!) o seu troco e vai-se embora. Até aqui já seria uma história engraçada de contar aos amigos durante aqueles almoços monótonos e sem assunto. Mas a vida é uma caixinha de surpresas, para citar um famoso sketch humorístico. Enquanto eu me preparava para digitar a senha do meu cartão, para pagar pelas minhas comprar (salada, peito de frango e 7 caixinhas de morangos congelados, para os curiosos) a chinesinha de 25 anos, com cara de pré-adolescente volta, se mete na minha frente e começa a gritar as palavras (sons?) que dão título ao post:
- I – Seven - Nine – Pay – No, No, No. 
- I – Seven - Nine – Pay – No, No, No. 
- I – Seven - Nine – Pay – No, No, No. 

A caixa me olha. Eu olho pra caixa. Ambos olhamos pra chinesa. Ela está furiosa. Ela segura um quilo de farinha na mão e grita:
- I – Seven - Nine – Pay – No, No, No. 
- I – Seven - Nine – Pay – No, No, No.

Tentando ajudar, olho pra chinesa e pergunto: - What happened?
Ela me olha, como se quisesse me matar com olhos, já achando que eu faço parte do staff do supermercado e grita ainda mais alto:
- I – Seven - Nine – Pay – No, No, No. 

Ela toma mais um fôlego, pensa da Amy Winehouse, e grita de novo:
No, No, No. Seven. Nine. Pay. No, No, No. 

Eu, tentando me desvencilhar daquela confusão, os outros clientes já me olhando, pensando que eu tinha xingado a chinesa, a caixa nos olhando, pensando que estava sendo gravada para a versão alemã da Pegadinha do Mallandro (rá-yeah-yeah) a chinesa gritando: No. No. Seven. Nine. E mostrando aquele saco de farinha.
Percebo que ela não concorda com o que pagou pela farinha. Que há um desencontro entre o preço apontado na prateleira e o preço que ela pagou. Tento acalmar e digo:
- Ok. I understand your predicament. You paid one euro and seventy-nine cents for this flour. How much do you think you should have paid? 

Percebo que a frase está um pouco complexa. Reformulo:
- You seven nine. How much you pay?- pergunto como se fosse o Tarzan recém aprendendo a falar. Ou a Chita. 
Ela me olha e diz: - I pay one four nine. No seven nine. Too much. Too much.

Respiro fundo, olho pra caixa e explico a situação. A caixa me olha, incrédula, e pergunta o que ela deve fazer. Eu olho pra ela e digo: - Chama o gerente.
Rapidamente saio do supermercado, monto na minha bicicleta e venho pra casa. No caminho me sinto culpado por ter abandonado a chinesa no supermercado, reclamando os seus trinta centavos. Só espero que o gerente não chame a polícia.
Chego em casa, sento para escrever este texto com apenas um pensamento na cabeça: eu sou uma pessoa ruim. 

segunda-feira, 14 de maio de 2012

08.47pm

Lembram disso aqui?!
Poi zé. 


Tirada agora, quase nove da noite. 
Serão dias longos esses que me aguardam... 



segunda-feira, 30 de abril de 2012

Almoçar sozinho


Hoje era um dia em que eu queria estar perto; e eu estou longe. Muito longe. Longe demais. 
Há uns meses, um conhecido me disse que há uma glorificação e galmourização dos doutorados e dos doutorandos no exterior. As pessoas que os fazem aumentam as dificuldades vivenciadas e experimentadas para não parecerem que passam bem e mascarar a realidade: a vida de um doutorando no exterior é uma maravilha. Os que veem (acento?) de fora teriam, segundo ele, uma visão menos deturpada, de observadores isentos e enxergariam a verdadeira rotina: muitas festas, algum estudo e uma vida mansa. Nada mais errado. Nada mais errado. 
A vida de um doutorando no exterior não tem nada de glamour. Nada. É um sofrimento só. Falo não da perspectiva do observador, mas do partícipe. Eu sou um desses, cuja vida é uma ausência completa de glamour. Passo os dias enfurnado numa salinha, envolto por livros, cópias e cabos de computador. Algumas fotos de família estão num canto. E nada mais. Moro em um quarto e sala, sozinho, sem televisão. Faço quase todas as minhas refeições no RU, que, apesar de ser um dos melhores da Alemanha, continua sendo um RU. Tudo tem o mesmo gosto. Comer brócolis, carne, alface, frango, arroz ou batata frita não faz nenhuma diferença. Tudo tem o mesmo gosto que eu, carinhosamente, digo que é gosto de chuchu sem sal. Além disso, a maioria dessas refeições é feita solitariamente. Só quem come sozinho, sabe a tristeza que isso representa. As poucas refeições feitas na companhia de amigos são comemoradas como se fossem uma indicação para um Prêmio Nobel. 
Se aquele seu amigo veio fazer mestrado ou doutorado e passa os dias no Facebook postando fotos de lugares legais, de festas e de novos amigos, pode ter certeza: não está fazendo porra nenhuma. Doutorado é sofrimento; mestrado é renúncia. Sofrimento longe de quem nos faz bem; renúncia longe do que nos faz bem. 
Hoje à noite recebi mais uma notícia triste. Mais uma para o manancial que recebi nesses últimos três anos. Perdi gente que eu amava e que era muito amada por quem eu amo. Sofri por doenças de pessoas que eu amo mais do que a mim mesmo. Sofri com doenças que eu tive, provocadas pelo meu desleixo. E tudo isso a quase 10.000 quilômetros de distancia. Sem um abraço, sem um afago, sem um carinho. 
Nada. 
Se almoçar e jantar sozinho, todos os dias, já é complicado, imagine receber a notícia que um ente querido está doente. Ou escutar a voz triste da mulher amada. Ou do pai amado. E da mãe amada. Ou de um amigo que só queria sair tomar uma cerveja e jogar conversa fora. 
Glamour? Não existe, como eu dizia. 


**********

Update: Recebi algumas ligações e mensagens preocupadas, perguntando-me se há alguém doente na família. Não. Não há. Agradeço a preocupação e as mensagens e ligações, mas, por favor, não levem o que eu escrevo aqui tão a sério. Esse é, afinal, um blog de humor. 

terça-feira, 24 de abril de 2012

Egocentrismo


Redes e aquários 
Jõao Pereira Coutinho
Há um novo crime na praça. E eu sou culpado aos olhos de amigos, colegas, até leitores. Não respondo a e-mails de imediato. Só passados alguns minutos -ou algumas horas.
Defendo-me como posso. Digo, a sério, que só consulto a internet duas vezes por dia -ao acordar e ao deitar. Questão de higiene -mental. Curiosamente, quase sempre estou a escovar os dentes.
Ninguém acredita. E, quem acredita, diz que isso não é desculpa: existem uns celulares que recebem e-mails em tempo real e permitem respostas em tempo real. Agradeço a informação, mas não era preciso: eu próprio já recebi e-mails do gênero, que terminam com a declaração solene "esta mensagem foi enviada por iPhone". Nunca sei que responder: mostrar-me abismado com a proeza e aplaudir a grande honra que o sujeito me concedeu?
Às vezes, há situações bizarras. Alguém envia um e-mail. Minutos depois, envia outro, só para perguntar se eu recebi o primeiro. Duas ou três horas depois, vem mais um -dessa vez, uma repetição do inicial, para o caso de eu não ter lido.
Essa comunicação unilateral termina com um quarto ou um quinto, em que sou acusado das maiores baixezas (indiferença, preguiça, hostilidade etc.).
Em poucas horas, alguém iniciou e terminou uma comunicação comigo sem que eu jamais estivesse presente para dizer "presente!". Que se passa com o mundo? Os especialistas no assunto, psicólogos e sociólogos que pesquisam os paradoxos da internet, afirmam que estamos cada vez mais ligados e exigimos respostas cada vez mais rápidas uns dos outros. Certo, especialistas do óbvio, certíssimo.
A questão, porém, deve ser outra: que tipo de gente a internet está a produzir no século 21?
Foi precisamente essa pergunta que o escritor Stephen Marche formulou em artigo para a revista "The Atlantic" ("Is Facebook Making Us Lonely?"). As conclusões não são otimistas: estamos todos ligados, mas essa sensação de contato permanente não significa que o nosso isolamento (e a nossa solidão) decresceu. O Facebook é, inevitavelmente, um caso clássico: que significa esse imenso continente virtual onde "existem" 845 milhões de pessoas, onde se publicam bilhões de comentários diários e onde se postam 750 milhões de fotos por semana? Stephen Marche não faz parte dos luditas modernos para quem o Facebook é a "bête noir" da civilização ocidental. A resposta dele, depois de ler os últimos estudos sobre o fenômeno, é de uma sensatez que arrepia: a internet é um meio, não um fim. O que somos como seres sociais depende da forma como usamos as redes sociais.
Que o mesmo é dizer: quem usa o Facebook para substituir a realidade não aumenta o seu "capital social". Pelo contrário, pode mesmo sentir o isolamento típico de um peixe que contempla o mundo através do vidro do aquário. Paralisante. Angustiante. No artigo, o autor cita um neurocientista da Universidade de Chicago, John Cacioppo, que oferece uma metáfora ainda melhor: podemos usar o carro para ir ao encontro de amigos; ou podemos dirigir sozinhos pelas ruas da cidade. O mesmo carro, duas atitudes distintas.
A internet, e as redes sociais que ela comporta, é apenas um instrumento para, não um substituto de. O desafio, leitor, não está em quebrar o aquário. Está em sair dele de vez em quando.
Sair. Desligar. Não estar disponível. Ou, como escreve Stephen Marche, "termos a oportunidade de nos esquecermos de nós próprios".Eis, no fundo, a observação mais luminosa do ensaio: a nossa constante disponibilidade para os outros é apenas uma manifestação mais profunda do nosso insuportável narcisismo. E o narcisismo, como sempre, nasce de uma insegurança que procuramos preencher com o culto doentio do ego. Pensamos que somos tão imprescindíveis que temos de estar presentes 24 horas por dia na vida alheia. E vice-versa: pensamos que somos tão importantes que os outros têm de estar permanentemente disponíveis para nós. Lamento, amigos. Lamento, colegas. Lamento, leitor. Os meus silêncios não têm nada de pessoal. Nem eu nem você somos assim tão importantes.





Folha de São Paulo - 24 abril, 2012

segunda-feira, 23 de abril de 2012

Malatesta

Muitos ainda não acreditam em mim quando falo que há momentos nos quais fica absolutamente impossível estudar, mesmo que de madrugada, na minha sala. Minha vizinha, a quem não conheço e que mora do outro lado da rua (leia aqui), costuma ser bastante, digamos e na falta de melhor palavra, extrovertida quando de suas aventuras lascivas. 
Para evitar quaisquer dúvidas futuras, gravei um pequeno vídeo no momento em que eu tentava me concentrar na leitura de um texto sobre a indeterminação e abertura semântica de regras jurídicas. Como vocês verão, é impossível pensar em qualquer coisa indeterminada com as uivos vindos do outro lado da rua. Pode-se, obviamente, pensar em coisas abertas e em aberturas, mas não semânticas. 
Reparem, ainda, que a minha janela está apenas entreaberta. A dela (eu juro!) está fechada!

Aumenta o som e sente o drama! 

PS - O título é uma homenagem ao antigo e esquecido Nicola Framarino dei Malatesta que escreveu o sensacional A lógica das provas em matéria criminal

sábado, 21 de abril de 2012

Let me rock you...

... to sleep.

quinta-feira, 29 de março de 2012

RIP, Millôr


Ao contrário da morte do Chico Anysio, acho que a perda de Millôr Fernandes realmente deixa o Brasil - e os brasileiros - menos inteligentes e menos divertidos. Ele praticava um ceticismo erudito ou, talvez, uma erudição cética; ele era um cético simples e erudito, ou um homem simples, erudito e cético, ou um cético simples em sua erudição. E tudo ao mesmo tempo, numa mistura que, atualmente, poucos podem ser dar ao luxo. 
Os vídeos que coloquei após a morte do criador da Salomé de Passo Fundo serviam para mostrar que existiam outros que faziam humor - diferente, mas ainda assim humor - de alta qualidade na televisão brasileira. 
O que Millôr fazia não há igual. E, infelizmente, não haverá igual. 

*   *   *   *   *   *

Nem só Pelé vive a glória do esporte:

Millôr (modestamente) vai completar 5.000
Negócio seguinte: até hoje não tenho feito reivindicações quanto a direitos meus. No pretenso anarquismo que me atribuem, figura justamente o princípio da suprema maturidade em relação ao meu semelhante, ou seja, cumpro o meu dever sem exigir o meu direito. (A não ser quanto às autoridades. Ao contrário do que elas se arrogam, no Brasil, elas não têm nenhum direito e têm todas as obrigações.)

Assim, sendo, não faço barulhos que incomodem o próximo depois das dez (os barulhos que faço não incomodam) e não reclamo dos barulhos alheios. Quando o cara vem na contramão (eu sei que ele está apenas corrigindo mais uma burrice do Kamerade Celso Franco, dono do Detran) eu me afasto pra deixar ele passar e não grito indignado: "Contramão!". Os poucos prêmios que recebi por minhas atividades pseudo-artísticas, eu devolvi às comissões subintelectuais que me distinguiram (ofensa não!).

Mas agora, bem, agora é demais. Agora sofro injustiça tão grande, tão clamorosa, numa atividade a que estou tão intensamente ligado, que não posso deixar de protestar. Não tenho nada contra Pelé ser homenageado de todas as maneiras ao completar 1.000 vezes em que mostrou sua potência específica, vazando o adversário, fazendo balançar o véu da noiva. Mas acho o seu feito meio fajuto perto do meu. Eu merecia muito mais: estou, posso dizer em absoluta honestidade e precisão, me aproximando da cincomílima vez em que faço o mesmo. No meu campo, é claro. Que tem apenas 1,90 por 1,70, não atrai o público pagante, não tem crítica especializada, mas nem por isso é menos popular do que o Maracanã. Acontece, porém, que minha atividade é um pouco mais difícil do que a do Divino Crioulo. Não é mole não. Não é, nem pode ser.
Coisa esta: depois de precisa contabilidade, descontando todas em que minha memória pudesse estar me traindo, apelando para as memórias de velhas amigas com quem tive oportunidade de me confrontar em dias idos, cheguei à conclusão de que estou muito perto das 5.000. Aliás, sei com exatidão a conta mas não pretendo divulgá-la ainda, por motivos particulares, sobretudo para evitar pressões: "Como é Millôr, sai hoje a 5.000?" "Como é Millôr, entra hoje a 5.000?" "Epa, Millôr, quem é a tua Andrada?" "Como é, Millôr, a 5.000 vai ser na Bahia, ou aqui mesmo na Guanabara?"
Cinco mil! Muitos pensarão que exagero, mas acho que sou até modesto, que estou me colocando dentro da mais absoluta normalidade, numa sóbria média de 3 por semana (não sou nenhum caso A.D.), com apenas uma dezena de goleadas através de minha vida profissional. Dentro desse esquema tão raro (que é a normalidade) os 1.000 de Pelé, pra mim, são pinto. Pinto, eu disse? Escapou-se-me a palavra.
Como ele, já penetrei na meta adversária driblando outros, já entrei com bola e tudo, de bicicleta, de saída, quase no fim da jogada, quando pensavam que eu não ia conseguir alterar o marcador, já entrei de lado, com violência, na maciota, na banheira, com malícia. Em suma: posso dizer que já fiz profissionais competentes engolirem frango, nunca marquei gol contra e já joguei em todas as posições. Tive, sobre Pelé, apenas uma vantagem, o adversário também objetivava o gol. Queria deixar entrar.
Minha carreira começou numa pensão da Glória. Mariazinha sem sobrenome (o meu Zaluar), registrou meu primeiro tento, depois de impedir algumas tentativas (na verdade não apreciava muito o esporte).Seis ou sete anos depois eu completava, sem que a imprensa desse a menor notícia a respeito, a número 1.000. Meu Andrada foi uma moça de São Paulo, (sempre adorei São Paulo) e, como o craque argentino, também chorou de emoção, embora, acredito, não pelos mesmos motivos. E, nos meus 1.000, foi o adversário vencido quem beijou a(s) bola(s).
Meia dúzia de anos depois, também sem nenhuma badalação (e não era por falta de badalo) eu completava a 2.000. Já então havia televisão. Vocês pensam que o Heron e o Rubens Amaral se cumprimentaram pelo meu feito? Nunquinha. Nem tomaram conhecimento.
Também minha contagem de 3.000, da qual saí com séria luxação no menisco (é menisco que se chama, pois não?) passou despercebida de tudo e de todos. Às manchetes do dia eram sobre a guerra fria. É por isso que os jornais não vendem. Se O PASQUIM existisse, evidentemente, teria dedicado sua primeira página à paz quente.
A número 4.000, homologada em ambiente próprio, com uma praticante cheia de vigor, foi feita (a atitude de Pelé é pura imitação) em homenagem às crianças pobres, pois a moça se preveniu com pílulas para evitar aumento de população e suas conseqüências sobre o pauperismo nacional. Ainda desta vez a publicidade não registrou o fato, o feito, e eu, discretamente, fiquei na moita (que, aliás, era onde eu estava).
Mas, agora, chega! Agora os veículos de publicidade têm que tomar conhecimento, a mass mídia tem que reconhecer e propagar o que faço. Agora a injustiça tem que ser reparada. Agora a imprensa tem que acompanhar passo a passo os meus passos, a televisão tem que mandar seus câmaras atrás de mim pra me dar cobertura enquanto eu, por minha vez, dou a minha.
Ainda não decidi, nem cabe a mim decidir sozinho (pois a coisa depende de circunstâncias e oportunidades) onde, como e com quem vou me defrontar para a 5.000. Terá, naturalmente, que ser com uma adversária à altura. Parece que o governo da Guanabara já está disposto a me oferecer a Praça General Osório, pra que a imprensa estrangeira possa também fotografar o magno acontecimento. Depois do sucesso do entrevero entre dois jovens na Ilha de Wight todos concordam em que esse esporte de alcova tende a se tornar público. De qualquer modo, o local ainda não está definitivamente resolvido, nem a modalidade conveniente para o ato que deverá motivar os mais jovens, tão carentes, ao que dizem, de inspiração nesse setor.
Questão fica assim: preciso me resguardar pra não realizar a 5.000 em local inconveniente ou momento inesperado, cedendo à provocação de uma amadora ocasional. Pois é evidente que vai haver muita provocação por parte de pessoas não credenciadas, que quererão participar da glória do evento. Tenho que me cuidar para que não me raptem, não me forcem, não me obriguem à 5.000 em local indevido, hora imprópria, pessoa inadequada. Também antes que os gozadores (lato senso) da praça (General Osório) comecem a propalar que talvez eu não consiga, que talvez eu pincele (o verbo pincelar vai aqui em homenagem aos pudicos, para não usar palavra referente a pincel mais grosso), afirmo logo que considero isso natural, no caso, e acredito mesmo que consiga chegar às 5.000 com excessiva facilidade. Pelé não tremeu, não se emocionou, não demorou a marcar o seu modesto milheiro? Nada mais natural que eu também fracasse algumas vezes diante da meta (atenção revisão: sem circunflexo ). A responsabilidade é enorme, o país inteiro está de olho em mim.
Mas eu chego lá. E garanto que, desta vez, tenho à mão inúmeros meios de divulgação, para registrar o feito histórico, senão único, pelo menos raríssimo neste mundo de incomunicabilidades. Pois a aldeia é global, mas ninguém come ninguém.
E, seja como for, mesmo que toda a imprensa comprometida com a glória de Pelé me ignore, me abandone, me sabote, tenho comigo, fielmente, os meus amigos d'O Pasquim, que já se cotizaram e, na passagem do grande acontecimento, vão, publicamente, me oferecer não uma, mas duas bolas de ouro.



O Pasquim n° 25, Dezembro/1969. Copiei daqui

Caruaru

Há uns tempos comentava com um amigo que um dos defeitos do Brasil é a ausência de uma elite. 
Palavra muitas vezes considerada um anátema, a elite em uma sociedade democrática e desenvolvida é, além de inevitável, indispensável. Precisa-se de uma elite para pensar, para criticar, para comandar, para, enfim, liderar quem não tem condições de fazer o que uma elite faz. 
Explicação óbvia, mas necessária: ser da elite não significa ser rico, ser playboy, milionário, afetado, etc., etc., etc. Antes pelo contrário. Uma elite pode se desenvolver também em grotões, com muito mais dificuldades, mas é possível. Um Chico Buarque não veio do nada; da mesma forma um Gilberto Amado; muito menos um Raymundo Faoro. Há uma frase do escritor francês Victor Hugo que diz: se quer civilizar alguém, comece pelos seus avós. E assim é. Enfim, continuemos. 
Dizia eu a esse amigo, que a nossa elite costuma ser ignorante, inculta, mesquinha, corrupta, preconceituosa, autocentrada, ególatra e egoísta. E, para nossa infinita tristeza, nossa elite é brega. Infinitamente brega. Incomparavelmente brega. Tristemente brega. Toscamente brega. Confunde riqueza com ostentação. Possibilidades com desperdício. Privilegia a aparência sobre o conteúdo; compra arte por que é cool ou hype, não por que entende que a arte é ao mesmo tempo uma busca pelo belo e um mecanismo de mudança social e contestação por excelência. Que não consegue diferenciar bom gosto do engodo do marketing. Que prefere o simulacro à realidade. Enfim, uma elite que não vê grande importância em cultura, em estudo, em educação. Mas vê muita importância em champagne. Que brilha no escuro, pois não?!

Ser mais fútil que Paris Hilton não é tarefa fácil. Parabéns, sr. Empresário Brasileiro!










































Quando estava pronto a me desesperar, li um dos comentários que, felizmente, salvou o dia. Zéferino (que é Zé e também é ferino) Brasilino mostra que, independentemente de nome e sobrenome, é possível ser da mais alta elite brasileira. Com senso de humor. E de proporção. Sem deixar de lado o bom gosto. 

Não representa a opinião do jornal, mas representa a opinião da elite caruarense.


sábado, 24 de março de 2012

Wittgenstein



Alguns poucos amigos sabem que eu estou traduzindo um livro do alemão para o português. Alguns outros amigos sabem qual livro é. Para os que não sabem, não se preocupem, não é nenhum best-seller. Mas o importante deste post não é a tradução em si, mas a dificuldade em encontrar palavras. Sim, palavras.
Um relato pessoal: há uns tempos minha família e eu fomos fazer uma viagem e, lá pelas tantas, meus pais (a quem amo incondicionalmente, mesmo depois desse episódio) me convenceram a trocar o ar-condicionado do meu quarto pela visita a uma "praia paradisíaca". Relutei, relutei, relutei, mas cedi. Que engano. 
Fomos numa van, sem ar condicionado (aqui há duas versões: a minha é a de que não havia ar-condicionado; a do meu paizão é de que havia, isso sim, um ar quente funcionando a milhão bem embaixo do banco dele) em direção ao paraíso terrestre. Lá pelas tantas, minha amada irmã já estava ficando branca e com pressão baixa em função do calor e eu, com toda a raiva acumulada do mundo, falei:
"Wittgenstein tem uma frase que diz que 'os limites da minha linguagem são os limites do meu mundo'. Não há mundos e nem palavras suficientes para descrever o meu arrependimento."
Minha mãe, que me ama muito, achou aquilo tudo muito engraçado e não conseguia parar de rir; a motorista da van achou que estávamos rindo dela e fechou a janela. O único calmo era o meu irmão, a pessoa mais sensacional do mundo (também nessas situações). E o sol, que olhava lá do alto, mandou mais alguns raios para nos castigar. 
Lembrei disso quando estava revisando a tradução. Como  traduzir isso? Não há palavra em português. Mas e se a tal palavra sequer está dicionarizada em alemão? E como traduzir aquilo? E aquela outra lá? Impossível, melhor explicar. 
Aí perco 3, 4 até 5 linhas para explicar uma palavra. E explicar, em si, não é conferir a minha interpretação ao significado da palavra que, a outro leitor, poderia ser diferente? Como escreveu Roland Barthes na sua Leçon, o poder da linguagem não é o que ela nos permite dizer, mas o que ela nos obriga a dizer. Divago. 
O que eu realmente queria escrever era: as dificuldades da tradução em nada se comparam à saudade que sinto do todos aqueles que eu amo e que estão longe. Mas para isso me faltam palavras. Dizer tenho saudade é limitado demais. 





Ter saudades é viver.
Não sei que vida é a minha
Que hoje só tenho saudades
De quando saudades tinha. 

Passei longe pelo mundo. 
Sou o que o mundo seu fez,
Mas guardo na alma da alma
Minha alma de português. 

E o português é saudades
Porque só as sente bem
Quem tem aquela palavra
Para dizer que as tem. 

Fernando Pessoa, Ter saudades é viverPoesia do Eu, Assírio&Alvim, 2006




RIP, Chico Anysio.




Ou, para rir mesmo, aqui (aviso: politicamente incorretíssimo).
E que se note: nos dias de hoje, tanto Mussum quanto Costinha, diante das sensibilidades exageradas, seriam processados, quiça presos. Crime é crime, afinal. E humor é qualquer coisa, menos crime, certo?!

sexta-feira, 23 de março de 2012

Tributos, ontem e hoje


"É mal que vem de trás, dos tempos do Brasil colônia. Portugal, ao tomar posse da terra nova, cuidou de uma coisa só: o Fisco.  A colônia existia para o Fisco. A Fazenda Real era tudo e os interesses do povo eram nada. E o Fisco se organizou atendendo unicamente às suas conveniências. O Fisco organizou-se cá muito a cômodo, sem respeitar coisa nenhuma além do seu  interesse - pessimamente entendido, aliás. Veio depois a Independência, a Monarquia, a República, e em todas estas mudanças se mexeu em tudo, menos no Fisco... E o país que se desiluda. Não haverá progresso possível enquanto não houver mudança na mentalidade a este respeito.” 
Acima vai a transcrição de um parágrafo do livro Mr. Slang e o Brasil, de Monteiro Lobato. Mais conhecido por ser o criador do Sítio do Picapau Amarelo, o escritor foi um importante crítico social no início do século passado. Mr. Slang e o Brasil, publicado em 1927, traz as opiniões de um inglês que, vivendo no Rio de Janeiro, passa a vida a analisar as mazelas que atingem nosso país. Dotado de grande espírito crítico, Monteiro Lobato traça um importante panorama da realidade tributária brasileira da época, focando sua crítica na elevada carga tributária e na burocracia impostas aos cidadãos brasileiros.
Qualquer semelhança com a realidade atual não é mera coincidência. Ano após ano, Receita Federal e Estadual anunciam novos recordes de arrecadação, numa sistemática que faz com que o contribuinte trabalhe mais de quatro meses apenas para o pagamento de tributos. Isso sem contar a monstruosa quantidade de contadores, advogados, consultores e auditores necessários para se manter atualizado nas constantes mudanças da legislação ou para manter uma escrituração fiscal correta. Essa interminável burocracia consome tempo e recursos preciosos, que poderiam ser efetivamente utilizados para aumentar a produção das empresas, gerando mais empregos e melhorando a renda dos trabalhadores. 
Tais fatos demonstram que, acima de tudo e de todos, está o interesse do Estado em arrecadar cada vez mais. Direitos e garantias presentes na Constituição e nas leis são, muitas vezes, abertamente violados apenas para não gerar “um rombo no orçamento”.
Com o início de mais um ano, é nosso dever como cidadãos sugerir e cobrar de nossos governantes uma reforma tributária que otimize a utilização dos recursos públicos, torne mais eficiente e menos burocrática a administração tributária, traga mais racionalidade à sistemática fiscal e, acima de tudo, seja mais justa na distribuição da carga tributária sobre os contribuintes. 
Em outras palavras: precisamos de uma mudança de mentalidade, com uma reforma que não busque bater recordes de arrecadação, mas que possibilite o equilíbrio entre as reais necessidades financeiras do Estado e os direitos e liberdades dos contribuintes. Usando as palavras do próprio Monteiro Lobato, escritas há mais de oitenta anos e inteiramente válidas ainda hoje: 
"Com o regime de impostos que tem, com os vícios burocráticos que alimenta, ainda é muito que o Brasil faça o que faz."