sábado, 3 de outubro de 2009

Maldição Olímpica

Lembrei de um texto antigo, publicado na Folha Online, escrito pelo Hélio Schwartsman (recomendadíssimo!), sobre o Pan de 2007. Se trocarmos a palavra Pan (e seus correlatos) por Olimpíadas (e seus correlatos), temos um belo resumo:
Entregando o Ouro Hélio Schwartsman

Deus é testemunha de que não tenho nada contra o esporte. Além de matar e morrer pelo Corinthians, gosto de ver as atletas da ginástica olímpica se estatelando contra o solo e até dou minhas corridinhas. De vez em quando, encaro os 42 km de uma maratona. Não é, portanto, por sedentarismo militante que dedico esta coluna a vilipendiar o Pan.

Minha preocupação é principalmente de ordem econômica. Em 2002, quando da candidatura do Rio de Janeiro a sede dos jogos, o Comitê Olímpico Brasileiro estimou o total de gastos em R$ 414 milhões (valores já corrigidos pela inflação), a maior parte bancada pela prefeitura. Cerca de 20% dos recursos viriam da iniciativa privada. Ao fim e ao cabo, a brincadeira saiu por R$ 3,7 bilhões, mais da metade proveniente das burras federais. Praticamente nada veio de empresas particulares.

Tudo bem. Obtivemos 54 medalhas de ouro, nossa melhor participação em Pans e quase superamos os comunistas ateus caribenhos. Com todo respeito aos atletas que se esforçaram para conseguir suas auricomendas, R$ 69 milhões para cada medalha dourada parece-me um preço exagerado.

Se tudo não passasse de incompetência para planejar eu não estaria sendo tão severo com os organizadores torneio continental. O meu receio é justamente o de que esse pessoal seja muito competente numa outra modalidade, que não está catalogada no rol olímpico, mas no Código Penal. Como explicar, por exemplo, que a reforma do Maracanã, orçada em 2005 em R$ 75 milhões, tenha consumido R$ 294 milhões? É mais que o suficiente para erguer novos e moderníssimos estádios. O de Leipzig, usado na Copa da Alemanha de 2006, saiu por R$ 244 milhões. O de Seogwipo, na Coréia do Sul, edificado para a Copa de 2002, ficou em R$ 203 milhões.

Se essa dinheirama pelo menos revertesse em ganhos permanentes para a cidade do Rio de Janeiro, eu não estaria sendo tão ranzinza. Não é, infelizmente, o caso. Dessa novela toda, só o que deverá ficar são alguns novos equipamentos esportivos e a vila olímpica, que ninguém sabe exatamente para que servirá. R$ 3,7 bilhões é um preço extorsivo para tão pouco. E que não venham as autoridades alegar que foram surpreendidas pelo baixo retorno. Economistas já até criaram o termo "maldição olímpica" para referir-se às cidades que despendem rios de dinheiro para sediar megacompetições esportivas e depois ficam a ver navios.

Se as autoridades tivessem um mínimo de respeito pelo contribuinte estariam fazendo tudo para evitar que o Brasil venha a ser escolhido para sediar a Copa de 2014 ou os Jogos Olímpicos de 2016. Aí, os R$ 3,7 bilhões agora torrados virariam uma brincadeira de crianças. [os gastos estimados para o Rio 2016 são da ordem de trinta bilhões de reais! Coloca mais os 25% da Lei de Licitações e bola pra frente...]

E, já que estou embalado nas críticas ao Pan, examinemos outros aspectos negativos do evento. Incomoda-me sobremaneira os incontidos brios nacionalistas que os jogos despertaram. Não estou, evidentemente, sugerindo que deveríamos torcer pela Argentina quando ela enfrenta o Brasil. Mas há uma diferença entre incentivar de forma saudável equipes e atletas do país e vaiar os competidores estrangeiros, o que viola o chamado espírito olímpico além de todas as regras da hospitalidade e da boa educação. A única vantagem desse comportamento é que ele torna mais remota a possibilidade de que o Rio de Janeiro venha um dia a sediar Jogos Olímpicos, pelo que os cofres públicos agradecem.

(...)

Pensando melhor, talvez o problema não esteja nos gastos absurdos e totalmente fora do planejamento, nem na imbecilidade do nacionalismo e nem mesmo nas regras sem pé nem cabeça do COI. Quanto mais escrevo, mais me convenço de que o problema sou eu. Já deveria ter aprendido que é bobagem cobrar racionalidade do ser humano.

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